Elogio à beleza

Texto de Alex Castro, que reproduzo aqui porque o próprio autor não o tem mais publicado em seu site, embora continue sendo uma percepção muito válida de como o nosso preconceito se estende até para áreas aparentemente unanimes, como a beleza.

Um escritor argentino, autor do livro de memórias “Feio”, está querendo criar um imposto sobre a beleza. Segundo ele, os belos obtém tantas vantagens adicionais que é justo que paguem impostos adicionais.

Obviamente, a proposta é imbecil mas, segundo o feioso autor, a idéia é provocar um debate. Então, vamos a ele: eu discordo. Mesmo sendo do Rio, a cidade mais obcecada com beleza física do mundo, eu ainda assim acho que a beleza anda menosprezada.

Se eu subo na vida pela minha inteligência, ou pela minha força física, ou pelo meu talento musical, ou até mesmo pela minha capacidade de fazer gols, tudo bem. Mas, de algum modo, subir na vida pela beleza é visto como algo baixo, leviano, fútil, sem valor, anti-meritocrático.

Quantas mulheres feias já não apontaram pra superiores gostosonas e acusaram: “Você só foi promovida por ser linda!”? Mas, por outro lado, quantas vezes homens burros apontaram para superiores e acusaram: “Você só foi promovido por ser mais inteligente que eu!”? Ninguém se sente injustiçado ao ser preterido pelo inteligente ou pelo talentoso, mas se perderem pro lindo, deus me livre, é um absurdo, um horror, uma injustiça!

Esse mito de que vencer pela beleza é menos meritocrático do que vencer pelo talento ou pela inteligência é uma das maiores mentiras que o lobby dos inteligentes já inventou.

É como o maneta tentando convencer o perneta a disputar uma corrida: ganhar pela queda de braço não conta. Ou a onça tentando convencer o ouriço de que seus espinhos são anti-esportivos: ele tem que encarar a onça de igual pra igual. E todos sabemos como acaba essa história.

O porco-espinho, como qualquer animal, tenta vencer usando as armas que possui, assim como os inteligentes tentam vencer pela inteligência e os talentosos, pelo talento. Errado são os lindos que caem no conto de que suas armas não tem valor, que vencer pela beleza não conta.

Se eu tivesse pernas pra cruzar ou decote pra mostrar, eu usava com a mesma naturalidade que uso minha lábia e minha cara-de-pau para conseguir tudo o que eu quero.

Comentário extremamente preciso de um amigo:

“Bem, nada mais justo então do que os inteligentes usarem sua arma, a inteligência, para convencer os belos a não usarem as deles.”

Concordo. Feios e barrigudos, só resta mesmo aos inteligentes tentarem mudar as regras do jogo. Burro é quem acredita. Entretanto, eu sou vira-casaca: acho gente inteligente um porre e idolatro a beleza. Além disso, ser agente duplo para os belos tem muitas vantagens: ninguém sabe quem foi Michel Foucault ou André Brissac, por exemplo, mas os favores sexuais mais do que compensam.

Assim como o mito do valor inerente da leitura só existe porque as pessoas que gostam de ler têm um lobby mais influente do que as pessoas que gostam de jogar bola em terreno baldio, esse mito da beleza como método não-meritocrático de subir na vida só existe porque são os feios que escrevem pros jornais e fazem as leis.