Enviado em 2018-02-09 22:55:45
Quando Carlos Guinle morreu, em 1969, Nelson Rodrigues disse:Está morrendo o nosso passado e, repito, um dia, acordaremos sem passado.
Na história recente do país algumas poucas famílias enriqueceram de forma tão espetacular quanto os Guinle. [...] Mas nenhuma dessas famílias influenciou tanto a formação da identidade brasileira e muito menos ergueu em torno do seu nome uma aura tão forte de sofisticação.
Teatro Phoenix - Ficava aos fundos do Hotel Palace
Como nenhum outro clã, os Guinle, desde o fim do século XIX souberam se mostrar como grupo capitalista moderno. Assim, quando Getúlio chegou ao poder, em 1930, e quis dar ao Brasil uma dimensão mais urbana e cosmopolita, afastando as velhas elites produtoras de café, ninguém conseguiu desempenhar tão bem esse papel como eles, passando a imagem de responsável pelo engrandecimento do novo país que surgia. Na segunda metade do século seguinte, no entanto, os Guinle se tornaram tão arcaicos quanto as elites agrárias que outrora ajudaram a tirar de cena.
Sede da Guinle e Cia
Em sua fase de ouro, cravaram marcos arquitetônicos como o Park Hotel em Nova Friburgo, a Granja Comary, em Teresópolis, e o Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, entre outros exemplos. Em termos musicais, promoveram Pixinguinha, Villa-Lobos e a Orquestra Sinfônica Brasileira. Nos esportes, transformaram o futebol em paixão nacional e despertaram o gosto do brasileiro pelo automobilismo. Doaram um riquíssimo patrimônio aos museus de todo o Brasil. Portanto, apesar de tudo, os ecos do passado ainda conferem prestígio ao sobrenome Guinle.
Sede das Docas de Santos
Em fins do século XX, quando não havia mais nada para ser doado, a família deu uma última demonstração de generosidade. Como o bairro do Botafogo fora tomado por um surto imobiliário que botou abaixo centenas de casas, deixando as crianças das redondezas sem espaço para brincar, Celina Guinle abriu para elas os jardins de sua magnífica residência, na rua São Clemente (primeira foto deste post).
O genial Nelson Rodrigues, em "À Sombra das Chuteiras Imortais", foi definitivo: "[...] o dinheiro não explica a grande e obsessiva presença dos Guinle na vida brasileira. O que realmente fascinava era uma certa atmosfera, ou, sei lá, um certo comportamento social e humano, a soma de certos valores espirituais".
Clóvis Bulcão
Ronaud Pereira
Publicado em www.ronaud.com/livros/livro-os-guinle-resenha/