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A ocasião faz o ladrão
Enviado em 2010-06-18 19:30:28
Ultimamente tenho publicado e escrito aqui alguns textos meus e de outras pessoas que atentam para a onipresente e ainda assim surpreendente passividade
bovina com a qual o povo submete-se ao
establishment e ao
pão e circo lifestyle, enquanto
os grandes continuam
lá em cima, à vontade, tocando sua agenda de ganância.
Por um lado, toda essa conversa, que me é nova, sobretudo em seu aspecto mais profundo e desumano, parece concluir que: Há os
fracos e oprimidos, e os
fortes opressores e
culpados por tudo ser como é, certo?
Não sei...
Tenho horror ao
conceito de culpa. Os
fortes opressores são responsáveis pela circunstância de dominação? (a qual não é atual) Sim, são! Mas são os únicos?
Creio que não.
Vejo de uma forma incisiva que
o povo é tão "culpado" pela situação da qual faz parte, quanto os
fortes. Sua "culpa" manifesta-se através de seu comodismo e desinteresse pelas grandes questões, e interesse egoísta pelas pequenas questões. Tal evento é de fácil identificação numa questão como a do bolsa-família, por exemplo: Este programa governamental é amplamente popular, todo governante agora se vê
obrigado a "aprovar" e "continuar" tal ajuda. Mas a questão fundamental nisso, que seria o povo exigir uma educação de qualidade, não é
tão exigida pelo mesmo povo que agora não aceita perder os incentivos de um bolsa-família. Sei que o assunto é discutível, mas serve para ilustrar que quando
a coisa pega para o seu lado, sob o risco de perder suas "facilidades" e direitos adquiridos, o povo
sabe defender seu lado muito bem.
Desconfio que teorias conspiratórias, por mais atraentes e lógicas que sejam, são só isso mesmo, teorias. Pois a conspiração é desnecessária.
O povo conspira naturalmente contra si mesmo. Enquanto houver um povo minimamente satisfeito, de
barriga cheia e novelas para assistir a noite, acomodado, alienado das questões mais importantes da sociedade, haverá o falso líder promovendo mais e mais o afundamento desse mesmo povo na inconsciência, bem como satisfazendo seus próprios e ilimitados interesses.
O que eu quero dizer é que
a oportunidade faz o ladrão. Enquanto o pessoal aqui de baixo não se importar, o pessoal lá de cima vai
roubar. Governo é consequência, não causa. Não adianta você ficar
batendo o pezinho esperando que o pessoal de cima não
roube, esse mundo ideal que você quer só existe na sua cabeça. Ele não existe e nunca vai existir realmente enquanto o povo, que realmente tem poder, preferir continuar lotando estádios de futebol e shows artísticos em vez de lotar o plenário de suas câmaras legislativas.
Mais e mais reforço minha crença de que cada um, e a coletividade por consequência, tem exatamente aquilo que merecem.
Nem mais, nem menos.
E quem consegue enxergar um pouquinho melhor a naturalidade de tudo isso, segue observando o cenário, tão aterrorizado quanto incompreendido (e xingado de
reacionário).
Ronaud Pereira
Publicado em www.ronaud.com/sociedade/a-ocasiao-faz-o-ladrao/