Quando o preço compensa

Quando o preço compensa

Como é impressionante o número de pessoas já com alguma idade, sozinhas, em busca de companhia, não é? E tão impressionante quanto esse número é a dificuldade que essas mesmas pessoas têm de encontrar um par com quem se deem bem. As tentativas são muitas e as chances são poucas.

Porém acho que as pessoas estão muito exigentes, atualmente. Talvez influenciadas pelas comédias românticas hollywoodianas com finais felizes garantidos, ou talvez pelo individualismo narcísico imposto pela publicidade contemporânea bancada pelo consumismo que quer lhe convencer que você merece tudo que há de melhor nesse mundo – e talvez não mereça, aliás, muito provavelmente não merece – o fato é que o povo está com uma dificuldade enorme de encontrar a tampa da sua panela.

Não estou dizendo que você não tem o direito de escolher. Porém se escolher demais, ficará sem opções.

Sempre repito uma lição que aprendi com um comentário sutil de uma colega de faculdade após um desentendimento que tivemos com um professor. Estávamos no ponto de ônibus aguardando o mesmo, muito chateados por um sermão que leváramos havia poucos instantes do tal professor turrão, e no fim do desabafo mútuo, ela finaliza: “É a vida, ninguém é perfeito”. Sim, o professor não era perfeito, como nós não éramos, como eu não sou e como você, lamento informar, também não é perfeito(a).

Então por que exigir tanto de seus futuros pretendentes a potenciais parceiros?

E você, o que tem a oferecer? Somente características boas?

Nenhuma ruim?

Quer pagar quanto?

Respondendo um comentário de uma leitora, lembrei de um ponto de vista que pode ajudar as pessoas a enxergarem melhor a realidade dos relacionamentos.

Companhia tem preço. E você decide quanto está disposto a pagar.

O preço normalmente não é financeiro – embora possa  ser 🙂

O preço é ACEITAÇÃO.

Ou a aceitação ou a solidão. Ao contrário do senso comum, a solidão não é algo intrinsecamente ruim. Ela permite que encontremos a nós mesmos, e que ouçamos a nós mesmos. Gênios conhecem bem o valor da solidão:

Minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem de grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite. Clarice Lispector

É a solidão que inspira os poetas, cria os artistas e anima o génio. Henri Dominique Lacordaire

Acredito que todos precisamos de momentos regulares de solidão (não isolamento, mas um breve afastamento) para podermos nos realinharmos através da reflexão e da auto-análise, o que se torna inviável com gente nos chamando a atenção o tempo todo.

Ou seja, a solidão tem sim seus aspectos positivos, como tem também seus aspectos negativos, muito bem conhecidos por todos.

Por outro lado, é sempre gostoso podermos compartilhar nossos momentos com pessoas especiais, não é? Só que pessoas especiais não quer dizer pessoas perfeitas. De modo que companhia também tem seus aspectos positivos, e seus aspectos negativos.

O pavor da solidão é maior que o medo da escravidão: assim, nos casamos. Cyril Connolly

Então se a solidão lhe provoca aquele vazio existencial, você poderá preencher esse vazio com a atenção de alguém, porém sabendo que essa atenção terá um preço: A aceitação dos aspectos negativos da pessoa. Um relacionamento onde se recebe atenções e espera-se ser aceito, onde porém não há disposição para aceitar, estará visivelmente desequilibrado.

Se os defeitos alheios lhe irritam a alma e você quer alguém que se encaixe perfeitamente em você, coisa que não acredito ser possível, tudo bem, é seu direito, fique sozinho, mas banque sua solidão. Não vai adiantar espalhar aquelas desculpas para sua solteirice quando quem sabe – muito provavelmente – o problema é você.

 Ele transa bem? Leva você para comer bons queijos e vinhos? É seu amigo? Então fica com ele. É o máximo que você vai conseguir de um homem. Marília Pera